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MST matou vacas prenhas na Fazenda Cedro, em Marabá? Entenda o caso

De um lado, fazendeiros e políticos dizem que MST decapitou vacas prenhas na fazenda Cedro. De outro, MST acusa fazendeiros de armação. Infelizmente, não há uma conclusão. Mas vale você ler o texto para entender o caso de um ponto de vista imparcial.

Na última semana de novembro e na primeira semana de dezembro uma série de fotos bizarras começaram a aparecer na internet. A imagem de vacas dilaceradas e munições de armas de grosso calibre começaram a aparecer online. Junto com as imagens, acusações de que integrantes do Movimento dos Sem-Terra estavam promovendo uma matança de animais na Fazenda Cedro, na cidade de Marabá (Pará).

Em meio a tudo isso, muita gente nos procurou para darmos um veredicto do caso. Infelizmente, ainda não é possível cravar se o MST realmente realizou a matança. Porém, achamos justo explicar o caso de forma imparcial, já que tudo que vimos na internet trata com exageros para um lado e para outro.

A acusação

Pelo o nosso levantamento, as imagens começaram a ser compartilhadas depois de uma página do Facebook apontou que administradores da fazenda teriam relatado que o MST realizou uma barbárie no local. Entre as ações do grupo, estaria a decapitação de vacas prenhas.

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A partir daí, as imagens começaram a se espalhar pela internet. Primeiro, outras páginas relacionadas à pecuária começaram a postar a história e botar lenha na fogueira. Depois, sites de defesa dos animais atentaram para a história e compraram a versão que rolava na internet (MST matou…). Por fim, o deputado Fernando Francischini (SD-PR) fez a história chegar ao Congresso. Leia umas das versões do texto que vasculha.

Boa noite pessoal essas fotos foram tiradas na fazenda cedro que fica na região de Marabá que foi invadida pelo movimento MST todos animais abatidos que totalizaram 20 animais são animais de alto valor genético, todas as vacas estavam com prenhez confirmada, um verdadeiro massacre e agora eu gostaria de saber cadê as autoridades será que vão tomar alguma atitude ou o PT vai abafar tudo com sempre, compartilhem ao máximo possível até chegar em alguém que possa fazer alguma coisa.

Além de Fernando Francischini postar as imagens em redes sociais, ele fez um requerimento para chamar o presidente do MST, membros da Fazenda Cedro e o delegado que investiga o caso. Detalhe: no texto de requerimento, ele já acusa o MST de ter cometido o crime. Leia:

Requer que esta Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) convoque os senhores João Pedro Stedile (Presidente do Movimento Sem Terra); Charles Trocate (Coordenador do Movimento Sem Terra em Marabá); Oscar Boller (administrador da Agropecuária Santa Bárbara); e o Delegado da Delegacia de Conflitos Agrários de Marabá, Dr. Alexandre Silva para prestarem esclarecimentos sobre a invasão da Fazenda Cedro, no Município de Marabá, onde diversas Vacas Matrizes, que inclusive estavam prenhas, além dos maustratos, foram mortas pelos invasores.

O requerimento não foi aprovado na CPI criada para investigar maus-tratos aos animais por falta de quórum (vale lembrar que estávamos em uma semana de aprovação de Ajuste Fiscal, aprovação de pedido de impeachment e de investigação contra o presidente da Câmara). Após o requerimento ter sido negado, o deputado Eduardo Bolsonaro (filho de Jair Bolsonaro) publicou o seguinte:

Essa semana o MST invadiu a fazenda Cedro, em Marabá-PA, e executou com requintes de crueldade diversas vacas matrizes, muitas delas prenhas. Foram dados tiros de calibre 12 nos bovinos, foram retiradas apenas as partes nobres das vacas, seus fetos abandonados ao chão e muitos animais foram apenas executados por pura maldade e largados agonizando. As imagens dessa foto são light perto dos vídeos, mas chegou a hora do líder do MST prestar contas. O Dep. Francischini fez requerimento na CPI dos maus tratos de animais para CONVOCAR – CPI convoca, comissão convida – o líder do MST João Pedro Stedile. Através de manobra do Dep. Nilto Tatto (PT-SP) a convocação de Stedile foi infelizmente cancelada. Prevaleceu a vontade de um, por haver lacuna em nosso regimento interno…

A defesa

Em meio a todas acusações e em uma semana atribuladíssima, o MST respondeu as acusações depois que o material viralizou. Mas quando o fez, negou veementemente por meio de nota no site. De acordo com o que apontou o MST, as acusações são uma tentativa de criminalizar as pessoas que estão no local.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Pará (MST/PA) vem a público manifestar REPÚDIO as investidas dos latifundiários do Pará para criminalizar o Movimento e as centenas de famílias de trabalhadores e trabalhadoras rurais Sem Terra, que resistem nos acampamentos dessa região transformando fazendas antes improdutivas em comunidades de trabalho e produção de alimentos saudáveis.

Pesa sobre nós – divulgado por uma comunidade do facebook denominada de “Pecuária Brasil” – a acusação de ter “abatido centenas de vacas prenhas” em fazendas do sul e sudeste do Pará e, em especifico na Fazenda Cedro (localizada em Marabá). Para nós, Movimento Sem Terra, isso não passa de mais uma acusação infundada com o intuito de incitar o ódio de setores conservadores da sociedade contra as formas legitimas de manifestação pelos direitos sociais garantidos pela constituição brasileira.

A origem duvidosa das fotos mostra quão é frágil essa acusação, onde qualquer apuração mais séria e menos tendenciosa pode atestar a falsidade destas informações. Como seria possível, se em 2012, durante um ato de manifestação ao passar em frente à fazenda em questão (Cedro) os seguranças da fazenda, fortemente armados, atiraram contra os manifestantes deixando 22 pessoas feridas, dentre estas uma criança. Como seria possível, entrar na fazenda para “abater” 20 vacas no interior da sede e nada ter acontecido? Nem mesmo um meio de comunicação ser notificado? Ou a delegacia de conflitos agrários ser acionada?

A fazenda em questão está em processo de negociação e muito seguramente se transformará em Assentamento de Reforma Agrária. Neste sentido o MST Pará se coloca a disposição da sociedade para contribuir com qualquer possível investigação sobre este acontecimento. Seguimos em luta pela desapropriação da área para fins da Reforma Agrária, e pelo fim do Latifúndio nesse país. Lutar, Construir Reforma Agrária Popular!

Logo após publicar a nota, o MST não tocou mais no assunto. De certa forma, o movimento ficou muito ocupado com o pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Detalhe: depois que o MST publicou a nota, sites de defesa dos animais reiteraram a informação e apontaram que ainda não se sabia quem havia feito aquilo. Outros blogs também começaram a apontar que tudo não passava de uma armação para criminalizar o MST.

O que a polícia diz

Como vocês puderem ver, há, na realidade, uma troca de acusações. E como quase tudo no Brasil, a coisa foi parar na esfera política. Porém, quem está investigando o caso tem feito isso com muito cuidado. Entramos em contato com o instituto que realizou perícias no local e a resposta foi insatisfatória. Leia:

Pergunta:

Nos últimos dias têm circulado a informação de que o MST promoveu uma matança de animais na Fazenda Cedro, em Marabá (PA). Vi em algumas reportagens que vocês estão fazendo a perícia do caso. Gostaria de saber se vocês já têm algum posicionamento se foi o MST ou alguém da própria fazenda que promoveu a morte de animais.

Resposta:

O Centro de Perícias Científicas “Renato Chaves”, através de sua Unidade Regional em Marabá, realizou perícia de constatação de mortandade dos gados na Fazenda Cedro, na última terça-feira (01). E hoje a tarde (03), um perito criminal voltou a fazenda para realizar nova constatação. O Centro não determina autoria de crimes, apenas revela indícios, quem determina é a autoridade responsável pelo caso ou a justiça.

A polícia também aponta que só tem investigado o caso. Essa matéria do G1 do Pará endossa a informação da perícia, mas não fala nada de nenhuma conclusão. Porém, levanta uma terceira hipótese: roubo de carne para venda clandestina. De acordo com o texto da matéria, ainda estão apurando.

 O nosso veredicto

Pois bem, depois de explicar tudo vamos apontar o que já temos de informações: infelizmente não vamos poder cravar (ainda se o MST cometeu o crime). Tão importante quanto isso, queremos levar para vocês uma situação muito complicada que acontece na região. Pois bem, vamos aos fatos:

1 – Pelo o que tudo aponta, as fotos não são montagens. Sim, morreram vacas na Fazenda Cedro e como as fotos mostram, isso aconteceu com requintes de crueldade.

2 – Realmente há uma guerra onde não morre só gado (que aliás é o “produto” da coisa) como também gente na região. Vale lembrar que foi na região que aconteceu o massacre de Eldorado dos Carajás e no estado que morreu a missionária Doroth Stang. Ou seja, os latifundiários estão longe de serem “santos”. Muito menos homens contratados para “proteger os locais”

3 – Há sim problemas de integrantes do MST e Justiça local. Essa matéria aponta que drogas e armas foram apreendidas entre integrantes do grupo. Essa outra acusa o grupo de depredar outra fazenda na região. Mais um detalhe: nessa oportunidade, o MST também negou a história e ela caiu no esquecimento.

4 – É importante frisar que os grupos de defesa dos animais que participaram das postagens o fizeram de forma imparcial. Nem defenderam fazendeiros nem integrantes do MST.

5 – A hipótese de armação contra o MST não é impossível. Também não é impossível que o MST tenha feito a ação. Assim como também não é impossível que ladrões de gado tenham se aproveitado da situação para agir.

6 – A gente concorda que o caso seja investigado, por que não em uma CPI. Agora, é preciso que o caso seja analisado na CPI com equilíbrio. A vamos convir, nem Francischini nem Bolsonaro são exemplos de isenção nas opiniões.

Em resumo: não sabemos e não podemos cravar um veredicto. Mas devemos frisar que ainda é cedo (pelo menos até que a polícia defina isso) para acusarmos A ou B de ter feito a matança. Ou seja: a matança não é boato. Agora, acusar MST ou fazendeiros de ter feito a ação é “comprar politicamente” uma versão da história.